Estava eu muito bem a masturbar-me com uma faca quando me lembrei de uma velha história que gostaria de partilhar convosco. É uma fábula. Pois, os animais falam.

Num belo dia um escorpião aproximou-se dum sapo à beira de um rio e disse-lhe o seguinte:

- Olá Sapo.

- Olá Escorpião.

- Estás bom?

- Eu estou e tu?

- Eu também. Oh Sapo podias-me fazer um grande favor?

- O que é que tu queres?

- Podias-me levar até à outra margem?

- Porque é que não vais à volta?

- Porque é uma volta do caralho.

- Ah pois… Não levo nada! Estás parvo?

- Então porquê? Custa-te alguma coisa?

- A mim não me custa nada mas se te levar tu ainda me picas e vou desta para melhor.

- Achas que sim? Então se fizesse isso morríamos os dois. Tu do veneno e eu afogado.

- Realmente é verdade. Então vá, salta lá para cima de mim. Mas com juizinho e respeito senão pá próxima vais a pé que te fodes.

Lá se fizeram à água e assim que estavam a meio do rio o escorpião dá uma ferroada no sapo e injecta-lhe mesmo na veia uma bojarda que dava para abater um 747. Espantando com a situação e emitindo as suas últimas palavras, o sapo diz para o escorpião:

- FODA-SE!! Porque é que tu fizeste isso?

- Porque é da minha natureza.

E morreram os dois.

Deixo-vos uma questão. Quantas vezes na vida não foram já vocês sapos ou escorpiões?

Desde tenra idade que nunca fui grande fã de puzzles e cada vez entendo melhor o porquê. Logo à partida, havia uma série de actividades muito mais interessantes para fazer do que estar dias a fio a tentar encaixar peças umas nas outras para no fim ter como recompensa uma imagem pixelizada de uma paisagem suíça. Mandar pedras para dentro de água, desmontar carros telecomandados ou ver o TV Rural pareciam êxtases de emoção comparados com fazer um puzzle de mil peças.

Para além da semana de tédio assegurada, havia ainda o desinteresse com que todas as outras pessoas viam esta actividade. Recordo-me de entrar em casa de amigos meus e ver estampadas na parede as mais variadas imagens de puzzles que agora adquiriam o estatuto de quadro. Quer fossem carros de Formula 1, paraísos tropicais ou a já referida casa nos Alpes para mim era igual. Aquilo não tinha interesse nenhum. Nunca percebi o motivo de tamanho orgulho. Não fora pintado nem criado pela própria pessoa. Era pura e simplesmente algo que não revelava nada que não se conhecesse já de antemão. Uma obra sem um pingo de originalidade. No fundo era somente uma ordem, um caminho já pré-determinado para chegar onde alguém lhes tinha mandado ir. Sem me aperceber disso na altura, decidi que se alguma vez na vida fosse resolver um puzzle seria sobre algo novo e único. Escolhi a vida e a minha passagem por ela. Tinha acabado de nascer um existencialista.

Era um desafio colossal que me iria ocupar o resto da vida. À minha frente tinha muito mais que mil peças, sem um única proveniência e todas claramente únicas. A eternamente incompleta imagem que ia criando, alterava-se a cada instante. Fiz, desfiz e refiz. Por vezes de inicio, à medida que me ia apercebendo de tudo o que estava errado. Sem um ritmo coerente. Grandes secções do puzzle surgiam em curtos espaços de tempo enquanto que outras, por vezes até aparentando ser bastante simples, arrastavam-se anos sem se enquadrarem, impedindo assim que a imagem fluísse como um todo.

Mas nunca desisti, teria que ter a solução para o seu problema. Não seria agora, passado tanto tempo, que iria deixar peças por encaixar. Que o puzzle ficasse incompleto eu até admitia, agora que não se revelasse como um todo e se cumprisse isso para mim seria impensável. Lutei pela resposta, estudei o assunto até à exaustão. Após tanto raciocínio e experimentação cheguei a um nada inconsolável. Como tal fiz o melhor que se deve fazer numa situação destas. Fui dormir. Decerto que o meu mal seria sono.

Até que um dia acordei. Agora, as coisas jamais seriam as mesmas. O que se seguirá a partir de hoje neste espaço é o seu relato.