Fui a França. Volto daqui a quinze dias.

Se a vida não é estranha, então não sei o que o pode ser. A sério. Há certos momentos em que isto não faz sentido nenhum. Ou pelo contrário, faz sentido a mais. Simplificando e exemplificando.

Imaginem o seguinte. Estão com uma fome desgraçada. Com aquela fome de quem seria capaz de comer um bife maior que a vaca, se tal coisa existisse. Em que ficam vidrados a olhar para a grelha de uma churrascaria. Babando-se compulsivamente até fazer uma poça aos pés. Enquanto os frangos em pelota dão cambalhotas para trás.

Vão até um centro comercial. Lá existem pelo menos uma dúzia de restaurantes. De todos os tipos e para todos os gostos. Seria de pensar à partida, que a atitude mais lógica, devido ao voraz apetite, era entrar no primeiro tasco e pedir qualquer coisa para matar o bicho.

No entanto, mesmo para os que raramente são indecisos como eu, é o contrário que se passa. Visto estarmos desesperados com fome, a indefinição torna-se bem maior. “Estou mesmo esganado. Não vou comer qualquer coisa. O que é que vai ser para resolver isto a fundo? O que é que me apetece mesmo?”. E ali ficamos. Especados a olhar para luzes de néon.

Por esta altura já mal nos lembramos que temos fome. Agora a nossa preocupação é outra. Agora o que queremos mesmo é nem mais nem menos que satisfação absoluta. Tendo em conta o estado da situação, temos de tomar a mais acertada das decisões. Se tivéssemos pouca fome até que éramos capazes de morfar uma merda qualquer e estava despachado. Mas assim não. Agora precisamos de algo, substancialmente e profundamente bom. Algo que nos encha a barriga, o gosto e o espírito.

Após este absurdo dialogo interno. Começamos a ponderar. A avaliar todas as possibilidades. A sandes de frango panado vs a dobrada à Transmontana. O sumo de frutas vs imperial. Batatas ou arroz? Quem sabe, massa? E onde? Em que esplanada sem luz solar me irei sentar a degustar este manjar dos deuses?”.

Após todas estas opções, a conclusão é inevitável. Tomamos sempre a pior decisão possível. Olhamos para o nosso prato e para o dos outros e temos a certeza de ter feito a mais errada das escolhas. Independentemente daquilo que trouxemos para a mesa o que nos estava mesmo a apetecer era outra coisa completamente diferente. Se trouxemos uma pizza, o que queríamos mesmo era arroz de pato. Se por acaso trouxéssemos o arroz de pato estaríamos babados a olhar para a pessoa do lado enquanto o queijo derretido lhe escorria da boca.

E sabem porque é que nunca ficamos satisfeitos com a escolha? Porque lá fundo, não queríamos nem estar com fome, nem comer num centro comercial. O que queríamos mesmo era o aconchego de um lar, com comida caseira feita num forno a lenha. E se estivéssemos lá tudo nos saberia bem. Estávamos descansados e não perderíamos tempo com questões patéticas. O pior é que muitas vezes na vida, estamos tão longe e tão perto do sítio onde verdadeiramente queremos estar.

"Todos os partidos venceram. O que me agrada porque é o sinal de uma boa noite. O PSD venceu o PS. O PS venceu condições de extrema dificuldade. O Bloco venceu o PC. O PC vence sempre. E o CDS venceu as empresas de sondagens.". 
Ricardo Araújo Pereira

Absolutamente brilhante e nada mais há a acrescentar.

Para sairmos do fundo do poço, a que o último texto nos levou, mudemos de música. De música, mas não de interprete. Lançado no periodo d’ouro de Sinatra, Songs for Swingin' Lovers! retrata na perfeição o sentimento de amar e ser amado. A melhor de todas as sensações que um ser humano pode ter. Isso e ver o Benfica ser campeão europeu, com o boletim premiado do Euromilhões na mão e enquanto todo o elenco feminino da história dos Morangos com Açúcar se degladeia para te poder fazer um broche. Realmente soa muito bem. Mas perde o romantismo todo da coisa. Voltemos à música.

Dos vários clássicos que compõem este clássico decidi deixar-vos aqui uma das imagens de marca de Sinatra. Escrita por Cole Porter uns vinte anos antes, "I've Got You Under My Skin" é daquelas músicas que toda a gente conhece. A minha ideia inicial era colocar aqui a versão disponível no álbum Duets, com a participação de Bono dos U2. Mas em vez de estarem a ver um Frank Sinatra de capachinho, já todo comido pelo caruncho, porque não ver a lenda no auge dos seus poderes? Uma actuação notável em 1965, acompanhado pela Count Basie Orchestra dirigida por Quincy Jones. Minhas senhoras e meus senhores, apaixonados ou desolados, tristes ou maravilhados, Frank Sinatra. 


A revista inglesa Q colocou este álbum no topo da lista dos “'15 Greatest Stoner Albums of All Time.”. O que traduzindo dá qualquer coisa como “o melhor álbum de todos os tempos para apanharmos uma ganda bezana/moca/broa ou qualquer outra expressão semelhante. Basicamente a banda sonora ideal para nos fodermos todos.

Só por aqui se nota que não estamos a falar de caras sorridentes e positivismo como lema de vida. Aqui saímos para a rua, para um beco mal iluminado, através da cinzenta e pesada porta dos fundos. Aqui estamos no degredo, na merda. Bem longe de céus limpos e prados verdejantes. Aqui estamos na mais deprimente das situações. Tristes, sós, abandonados e com um brutal desgosto de amor.

Frank Sinatra elegeu este álbum como o seu favorito, de entre todas as suas gravações. Editado na segunda metade dos anos cinquenta, já perto do final da década, naquele que seria o melhor período de “The Voice”, Sings For Only The Lonely é um clássico que resiste à passagem do tempo.

A faixa mais marcante do álbum é aquela que o encerra. “One For My Baby (One More For The Road) relata o desabafo de um homem só. Refugiado num bar, deprimido, perante um empregado que faz o papel de padre neste confessionário com balcão. Mas em vez de o mandar rezar vinte Ave-marias e catorze Pais-nosso serve-lhe uma quantidade de álcool suficiente para embebedar uma orca. Uma penitência que não lhe trará a salvação eterna mas que ao menos lhe entretém o espírito.

Esta música foi inicialmente escrita para Fred Astaire utilizar no musical The Sky’s the Limit. E é mesmo isso que eu vos quero mostrar. Um registo diferente daquele que se viria a tornar o clássico de Frank Sinatra. Com uma performance magnífica do mestre do sapateado, esta actuação retrata bem o espírito inerente à música. O vídeo tem 10 minutos mas vejam só metade. É que quando acaba a música ele volta a encontrar a sua amada e acabam os dois muito felizes para sempre. Algo que não poderia estar mais longe de Frank Sinatra Sings For Only The Lonely.