No final do ano passado estive a fazer inquéritos de satisfação na área da saúde. Um dos sítios onde chateiem doentes em salas de espera com as mais desinteressantes perguntas foi no Pina Manique. Numa clínica de fisioterapia, na cave das instalações da Casa Pia.

Um dia, logo de manhã, estava mesmo a precisar de um café para despertar. Dirigi-me então ao bar lá em cima. Apesar de não estar lá ninguém àquela hora, possuía uma máquina de café. Esta ficava mesmo ao fundo de uma sala muito ampla. Enorme mesmo, parecia um salão para casamentos e baptizados. Ao atravessar esta mesma sala, a cambalear da soneira matinal, reparei no único barulho que se ouvia. Era o de uma televisão. Noticiando os acontecimentos do dia, parecia estar ali só. Mas não estava. Nem ela nem eu.

Enquanto deambulava tipo sonâmbulo, até ao fim da sala à procura da máquina de café, é que me apercebi do que me rodeava. Estava a atravessar uma sala repleta de gente. À minha volta para cima de trinta pessoas vegetavam como se de um jardim se tratasse. Medicadas e com uma idade profundamente avançada jaziam ali como quem já não estava neste mundo. Parecia que estava rodeado de estátuas. Completamente indiferentes à minha presença. Não eram maltratadas, muito antes pelo contrário. Mas a única coisa viva ali era eu. E àquela hora pouco entenda-se.

A primeira coisa que nos passa pela cabeça ao ouvir isto é o sentimento de pena pelas pessoas. Não o vou negar, até porque nem sonho qual a história de cada um deles e como ali foram parar. Mas tenhamos a coragem de pensar de outra forma. Livres de preconceitos e de merdas. Quantas pessoas não merecem acabar assim? Uma velhice decadente e solitária sem que ninguém lhes ligue pôrra nenhuma?

Porque essa é a verdade. Há muita gente que não merece nada de bom por parte dos seus e dos outros. Muito menos quando chega ao fim da vida e se tem um currículo que faz o Estaline parecer um menino de coro. E os mais irritantes ainda são aqueles que depois de mortos continuam a foder a vida dos que cá andam como se a sua presença fosse cada vez mais acentuada. Por isso está na hora de dizer mais uma vez. Que se foda, vive e deixa morrer!

Comments (0)