Sábado passado estava a olhar para a televisão a seguir ao almoço. Só não regurgitei porque já estou habituado a passarem imagens chocantes e nojentas no ecrã à hora da refeição. A razão da minha agonia chama-se Alta Definição. O Só Visto da SIC. Um programa que consiste em elevar ao estatuto de seres divinos pessoas que a única coisa que têm a mais que qualquer um de nós é uma mascara de base na cara.

A razão porque me irritam tanto este tipo de formatos televisivos é porque eles são um espelho de nós próprios. Um monte de tretas e actores da nossa própria existência. E então quando nos pomos a fazer retrospectivas daquilo que pensamos que foi a nossa vida atingimos niveis de treta abismais.

Qualquer convidado que vai a um programa destes teve uma vida absolutamente extraordinária. Origens humildes, dificuldades imensas que apenas o fortaleceram, uma família e um grupo de amigos maravilhosos, uma força de vontade soberba e um talento precoce para as mais variadas áreas. Devido a tudo isto a conversa acaba por ser algo do género:

“A minha família? O meu foi uma pessoa fantástica, um carácter forte que sempre me fez compreender a importância do trabalho. A minha mãe tem um coração do tamanho do mundo, um ser adorável. A minha irmã é muito inteligente, está em Washington a tirar um pós-doutoramento em física-nuclear-quântica-avançada-técnica-térmica-evolutiva. Para além disso, é o meu anjo da guarda, alguém que sempre esteve ao meu lado e me aconselhou nos momentos mais sensíveis. O meu irmão ainda hoje é o meu melhor amigo, um companheiro para a vida. Trabalha em Oslo e coordena a Academia Nobel.”

Mas que grande treta. Eu gostava que um dia fosse lá alguém que tivesse um pingo de honestidade. E que retratasse a vida como realmente é. Qualquer coisa mais parecida com isto:

“A minha família? O meu pai foi uma besta. Um bêbado incorrigível, que nos batia pelo simples facto de estarmos a respirar. Passava o dia em tascas a malhar copos pois era a única coisa que sabia fazer. A minha mãe é uma besta. Uma trombuda de primeira que nunca me deu um carinho. Aliás, nunca me lembro dela alguma vez ter sorrido a não ser no dia em que sai de casa. A minha irmã é puta, uma vaca de primeira. Deve ter rodado a escola inteira antes de ter acabado o segundo período do sétimo ano. Aliás, acho que já antes de qualquer período já ela andava a malhar a torto e a direito. O meu irmão está bem. Está preso. Finalmente encontrou um lugar onde se sente bem e pode chamar casa.” Ai como era bonito ouvir alguém assim. Mas a verdade é tão pouco popular por estes lados.

Comments (1)

On 6 de outubro de 2009 às 16:14 , Anónimo disse...

Hahahahha, bem dito pah!